A atitude contemplativa de saborear a vida em solitude

Você saboreia a vida contemplando seus passos e o tempo que passa consigo? Você sabe o que é solitude?  Saborear é um ato de leveza, uma atitude de desvendar os sabores, o que então se trata a frase saborear a vida? Talvez estejamos mais do que nunca precisando entender esses questionamentos, então apresenta-se a nós um desafio, abrir os olhos e o coração para enxergar além.

Por Frei Mendelson Branco, OFM

12/06/2020

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SOLIDÃO E SOLITUDE.

Existe uma diferença entre esses dois termos, que poucos sabem e que pode ser interessante desvendarmos e refletir para nossas vidas, a solidão muitas vezes se transforma em um vazio, onde a pessoa sente a falta de algo em sua vida.  essa sensação pode desencadear uma busca externa para fugir deste sentimento, porém muitas vezes a resposta deveria ser uma jornada interna.

Logo o indivíduo que sente o incomodo da solidão busca os estímulos externos, saciando-se nos momentos de festas que começam a fazer parte de sua rotina, ir a algum lugar sozinho se torna uma tarefa muito difícil e a compulsão por compras se torna grande para preencher o vazio que está dentro de si. Ou seja, você gera em seu interior uma dependência emocional com as pessoas ou objetos ao seu redor.

É claro que o homem e a mulher, sentem sim a necessidade de contato social, é normal e até saudável que essa relação aconteça, eu falo aqui de um medo de silenciar, uma atitude de fuga de estar consigo mesmo(a). Quando sinto medo de me encontra comigo mesmo(a), queremos fugir deste momento solitário preenchendo nosso dia com muitas atividades, o problema disso é, quando vou encontrar comigo mesmo(a)? muitas vezes para algumas pessoas, parar é um verdadeiro castigo.

Gostaria de apresentar então uma nova atitude para a vida, precisamos aprender a contemplar o sabor da vida, e para isso é preciso, parar para sentir o sabor, quem encontra a solitude, não sente medo de estar sozinho, essa atitude é o prazer de acolher a sua própria companhia. É o momento de dialogar consigo mesmo e com Deus, é o momento de conhecer-se, como nos desafia a frase “conhece-te a ti mesmo, em uma jornada interior sem fugir de si. Conhecer a verdade de si, sem máscaras. Santo Afonso de Ligório disse certa vez: ”Se quisermos ouvir a voz de Deus, amemos a solidão e procuremos, o mais possível, ter vida retirada afim de tratarmos a sós com Deus”.

CONTEMPLAR O SABOR DA VIDA EM SOLITUDE.

Nossa vida geralmente tem a presença de tanto tumulto, cronogramas, metas, as vezes somos muito escravos do tempo cronológico e o tempo da graça de Deus passa por nós e não percebemos. Certo dia, disse o Senhor à Santa Teresa: “Eu quisera falar a muitas almas; mas o mundo faz tanto tumulto em seu coração, que minha voz não pode ser ouvida.” É por isso que precisamos parar, e contemplar o sabor da vida, escutar exige tempo, exige saída do tumulto. É necessário estar em estado de contemplação na solitude, que se trata do prazer em estar só para escutar e contemplar, ouvir essa voz de Deus que fala a nossas almas constantemente.

Sentir os sinais de nosso corpo, refletir nossas atitudes, nossos passos, nosso dia. Um espaço de tempo em que Deus nos diz: “Ducam eam in solitudinem, et loquar ad cor eius” — “Eu a levarei à solidão e lhe falarei ao coração” (Os 2, 14). Naquela atitude descrita nas fontes franciscanas em que São Francisco de Assis se retira em oração no monte Alverne onde recebe os estigmas:

“Não o encontrando, pensou que ele estivesse em oração em algum lugar pelo bosque. Então saiu para fora e, devagarinho, à luz da lua, ia procurando-o pelo bosque. Finalmente, ouviu a voz de São Francisco e, aproximando-se, viu que ele estava de joelhos em oração, com o rosto e as mãos levantados para o céu e, com fervor de espírito dizia: “Quem és tu, ó dulcíssimo Deus meu? Quem sou eu, vilíssimo verme e inútil servo teu?”. Repetia sempre essas mesmas palavras e não dizia nenhuma outra coisa. Por isso Frei Leão, muito admirado disso, levantou os olhos e olhou para o céu. Olhando assim, viu baixar do céu uma chama de fogo belíssima e esplendidíssima, que, descendo, pousou na cabeça de São Francisco.” (I Fioretti 3)

É importante ao coração do homem e da mulher de fé deixar-se conduzir a solitude. Por muitas pessoas a solidão se trata de um vazio interior, para os que tem fé a solidão deve converter-se em solitude, assim como o relacionamento social é necessário para nós a solitude também é.

NA SOLITUDE SABOREAMOS A INTIMIDADE COM DEUS.

Como é bom e agradável escutar a voz de Deus, muitas vezes a procuramos e não conseguimos escutar, isso porque temos a sede mas não sabemos ouvir, buscamos nos tumultos externos, e Deus continua a nos falar, buscamos no vai e vem de nosso dia e Deus não se cansa de falar, e se pararmos um pouco e busca-lo interiormente? Veja oque nos diz Santo Agostinho:

“Tarde Te amei, ó Beleza tão antiga e tão nova… Tarde Te amei! Trinta anos estive longe de Deus. Mas, durante esse tempo, algo se movia dentro do meu coração… Eu era inquieto, alguém que buscava a felicidade, buscava algo que não achava… Mas Tu Te compadeceste de mim e tudo mudou, porque Tu me deixaste conhecer-Te. Entrei no meu íntimo sob a Tua Guia e consegui, porque Tu Te fizeste meu auxílio.

  1. Tu estavas dentro de mim e eu fora… “Os homens saem para fazer passeios, a fim de admirar o alto dos montes, o ruído incessante dos mares, o belo e ininterrupto curso dos rios, os majestosos movimentos dos astros. E, no entanto, passam ao largo de si mesmos. Não se arriscam na aventura de um passeio interior”. Durante os anos de minha juventude, pus meu coração em coisas exteriores que só faziam me afastar cada vez mais d’Aquele a Quem meu coração, sem saber, desejava… Eis que estavas dentro e eu fora! Seguravam-me longe de Ti as coisas que não existiriam senão em Ti. Estavas comigo e não eu Contigo…
  2. Mas Tu me chamaste, clamaste por mim e Teu grito rompeu a minha surdez… “Fizeste-me entrar em mim mesmo… Para não olhar para dentro de mim, eu tinha me escondido. Mas Tu me arrancaste do meu esconderijo e me puseste diante de mim mesmo, a fim de que eu enxergasse o indigno que era, o quão deformado, manchado e sujo eu estava”(…)” (S. AGOSTNHO)

Que seria se nos deixássemos conduzir pelo Senhor ao nosso íntimo, conhecer quem realmente somos, ouvir sua voz, quem sabe chorar nossas fraquezas nos braços do Senhor.  E ao partir nesta jornada contemplativa, curar nossas feridas. Procuramos fora, estamos muito fora e o Senhor esta dentro. A atitude contemplativa de saborear a vida em solitude, nos leva a olhar o doce e o amargo de nossas vidas e escutar a voz de Deus, conhecendo verdadeiramente quem somos e reconhecendo quem é o Altíssimo Senhor.

Referência:

A CRUCIAL (e libertadora) diferença entre “solidão” e “solitude”. [S. l.], 3 mar. 2020. Disponível em: https://pt.aleteia.org/2020/03/03/a-crucial-e-libertadora-diferenca-entre-solidao-e-solitude/. Acesso em: 1 maio 2020

AGOSTINHO, Santo. “Tarde Te amei!”. [S. l.], 1 mar. 2016. Disponível em: https://pt.aleteia.org/2016/03/01/tarde-te-amei-de-santo-agostinho-uma-das-mais-arrebatadoras-oracoes-de-todos-os-tempos/. Acesso em: 1 maio 2020.

DE ASSIS, Daniel Machado. Nem toda solidão deve ser curada ou reprimida. [S. l.], 20??. Disponível em: https://formacao.cancaonova.com/espiritualidade/vida-de-oracao/nem-toda-solidao-deve-ser-curada-ou-reprimida/. Acesso em: 1 maio 2020.

SILVA, Frei Mendelson Branco da. “A ATITUDE CONTEMPLATIVA DE SABOREAR A VIDA. [S. l.], 19 dez. 2019. Disponível em: http://ofmsantoantonio.org/?p=11553. Acesso em: 1 maio 2020.